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Descrição de chapéu Folhajus CNJ

Eliana Calmon revê opinião e admite cotas para promover juízas

Ex-corregedora atribui mudança ao boicote às listas exclusivas nos tribunais

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São Paulo

Eliana Calmon, ministra aposentada do STJ (Superior Tribunal de Justiça), aderiu às listas exclusivas para a promoção de magistradas. Quando o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) instituiu as cotas, em 2023, a ex-corregedora nacional, uma feminista, combateu a nova regra.

"A lista de merecimento feminina será um privilégio descabido para magistrados que serão preteridos", dizia. "É preciso que a mulher entenda que a luta não pode favorecê-la em uma carreira que nada tem a ver com o sexo e sim com o mérito."

Eliana diz que foi convencida a mudar de posição ao ouvir "a verdadeira história de como foi aprovada a tese das listas de paridade".

"Foi uma guerra", diz. As mulheres que lutam pela igualdade têm receio de sofrer retaliações.

Ellen Xandu, juíza do TJ-MS e membro do Movimento Nacional pela Paridade no Judiciário, e Eliana Calmon, ministra aposentada do STJ e ex-corregedora nacional de Justiça - Fernando Vivas/Folhapress e Arquivo Pessoal

Hoje, a advogada Eliana define as listas exclusivamente femininas como "a mais ousada das ações afirmativas" tomadas pelo Judiciário. "Outras menos ousadas foram tentadas sem sucesso, no Legislativo e no Executivo, e boicotadas por mudanças enganosas."

Eliana e a desembargadora Maria Lúcia Pizzotti, do TJ-SP, previram que as promoções seriam judicializadas.

"Os juízes foram prejudicados com a inusitada decisão que permitirá que as juízas furem a fila constitucional das promoções para o cargo de desembargador, para que se corrijam os erros do passado", disse Pizzotti, na ocasião.

Reforço aos movimentos

"Quando a resolução foi aprovada, sentimos muito a declaração que ela deu contra as listas exclusivas de mulheres, porque a opinião dela tem peso", diz a juíza federal Salise Sanchotene, relatora da proposta das cotas no CNJ [Resolução 255/23] aprovada por unanimidade no final da gestão de Rosa Weber.

"Temos muitos juízes trabalhando contra a resolução. Então, agregar a ministra Eliana nesta caminhada é motivo de muito orgulho e uma honra para o movimento pró paridade no judiciário", diz Sanchotene.

"A maior dificuldade na implantação da política de paridade de gênero é a resistência velada do Poder Legislativo e a passividade do Judiciário", diz Eliana.

"Nos países estrangeiros o reconhecimento da necessidade de empoderar a mulher para a obtenção da igualdade teve início no Poder Legislativo e deu certo. No Brasil, a incursão legislativa foi um fracasso", diz.

Ela tentou sem sucesso uma cadeira no Senado, em 2014, pelo PSB da Bahia. Em 2018, engajou-se na campanha de Jair Bolsonaro (PSL) à presidência da República. Afirmou que o candidato comprometeu-se a combater a corrupção e a atuar em defesa das mulheres. Na época, os filhos do capitão criticavam o feminismo.

O seu prestígio no movimento feminista aparentemente não foi afetado pela atividade político-partidária.

"Ela é um ícone para as juízas. Foi a primeira juíza de carreira a ascender a um tribunal superior; sempre foi muito firme em suas posições e nunca escondeu as dificuldades que enfrentou para chegar ao STJ", diz Sanchotene.

"Como é inspirador ver uma mulher livre, que revê embasadamente suas posições, mesmo que seja para desdizer o que disse antes", afirma a juíza Ellen Xandu, do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, membro do Movimento Nacional pela Paridade no Judiciário (1.700 juízas e juízes).

O Coletivo Sankofa de Magistradas (176 juízas) entende que a mudança de opinião de Eliana "reflete o amadurecimento que é esperado de toda sociedade, em especial do Poder Judiciário".

"A ação afirmativa de gênero introduzida pela Resolução CNJ 255/23, assim como outras políticas similares, perturbam o status quo e são recebidas com estranheza, até que sua natureza essencialmente justa seja compreendida e se imponha", afirma o coletivo, em nota.

O Sankofa informa que a promoção por listas exclusivas é realizada em, pelo menos, nove estados.

O grupo de 20 juízes de direito que impetrou mandado de segurança no Tribunal de Justiça de São Paulo para tentar anular concurso pelo critério de merecimento exclusivo para mulheres recorreu ao STJ.

"Eu não me arrependi de ter sustentado ponto de vista contrário, pois mudei quando fiquei convencida da necessidade e da seriedade das mulheres que lideraram a mudança", diz Eliana. "Entrei na briga na hora certa." Ela não recebeu convite para participar de nenhum grupo.

"Em política de gênero é preciso desigualar para obter a igualdade do segundo maior dos direitos políticos depois do voto: a mulher ser votada e obter a paridade representativa na política", afirma a ex-corregedora.

(*) Veja aqui a íntegra das manifestações dos movimentos feministas.

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